DÉBORA MACHADO
OXFORD,
REINO UNIDO (FOLHAPRESS) - Milhares de pacientes que precisam de um
coração novo mas não conseguem um transplante estão morrendo por não
terem acesso à tecnologia de ponta, diz o cirurgião Stephen Westaby, da
Universidade de Oxford, em seu livro "Fragile Lives" (sem tradução em
português), onde conta os casos mais envolventes de sua carreira,
marcada por inovações no uso de corações artificiais.
Corações
artificiais podem reduzir os sintomas e prolongar a vida de pacientes
com insuficiência cardíaca por anos, permitindo-lhes esperar por um
transplante em casa e até mesmo servir de solução permanente para os que
não se qualificam para receber um coração transplantado.
Porém,
com modelos chegando a custar em torno de R$ 500 mil, o acesso aos
aparelhos é restrito até em sistemas de saúde pública de países
desenvolvidos.
Westaby,
que ainda investe na construção de novos modelos de coração artificial,
mostrou que humanos não precisam de batimentos para viver. Pacientes
que passam pelo procedimento ganham um coração artificial que não produz
pulso, e precisam recarregar as baterias com um cabo implantado na base
do crânio. Um pequeno preço por mais tempo de vida com qualidade,
argumenta o médico.
Pergunta
- O livro fala sobre a operação da bebê Kirsty, que tinha uma anomalia e
estava prestes a morrer, até que o sr. decidiu realizar um procedimento
proposto pelo brasileiro Randas Batista, usado em pacientes com doença
de Chagas: remover parte do coração e remodelar sua geometria.
Stephen
Westaby - Tinha assistido à palestra de Batista numa conferência e
decidi que era a única coisa que ainda poderia tentar para salvar
Kirsty. Ele foi criticado pelos americanos porque eles tentaram aplicar a
técnica a outras doenças e não funcionou bem. Foi ótimo para Kirsty,
ela está saudável hoje, 18 anos depois.
Por que o caso foi marcante?
-
Anos depois, uma ressonância magnética mostrou que o coração dela não
mostrava sinais dos ataques cardíacos que tinha sofrido. O caso nos
ensinou que células-tronco fetais poderiam remover cicatrizes [do
músculo cardíaco]. Então começamos a fabricar células-tronco para tratar
adultos.
Realizamos
um estudo clínico na Grécia e vimos resultados parecidos. Foi um achado
extraordinário. Se Kirsty tivesse morrido, não teríamos descoberto essa
possibilidade animadora de regeneração.
É possível combinar células-tronco e coração artificial?
-
Fizemos isso [primeira fase de estudos clínicos] na Grécia. Colocamos
um coração artificial e células-tronco num paciente desesperadamente
doente cinco anos atrás e ele hoje vive uma vida normal e pratica caça
esportiva.
Partindo
de um quadro de deficiência completa, temos agora uma alternativa ao
transplante --e há tão poucos transplantes de coração que, no Reino
Unido, apenas em torno de 1% das pessoas que precisam de um o conseguem.
Estamos próximos de um tempo em que ter um coração artificial será tão bom quanto um transplante de coração?
-
Muitos centros de transplante alemães hoje recomendam corações
artificiais como primeira linha de tratamento e o transplante de coração
se houver problema com o dispositivo. As coisas estão mudando.
Eu
tive alguns pacientes com corações artificiais aos quais foi oferecido
um transplante de coração depois de dois ou três anos que eles viviam
com seus dispositivos e eles recusaram, devido à perda da qualidade de
vida.
Se
você passa por um transplante de coração, as drogas imunossupressoras
que terá que tomar podem causar câncer e outros problemas. Pelo caminho
que tenho trilhado, deve-se tentar melhorar a condição do próprio
coração dos pacientes com células-tronco enquanto eles têm um
dispositivo implantado. Isso se eles puderem pagar, porque sistemas de
saúde pública não poderão pagar.
O
sr. tem criticado o sistema de sistema de saúde pública do Reino Unido
por não pagar pelo uso de corações artificiais para pacientes que não se
qualificam a um transplante.
-
Acredito que cirurgiões [da rede pública] não deveriam ser obrigados a
virar as costas a pacientes arfando e que vão morrer desnecessariamente.
Deveria um sistema de saúde de primeiro mundo usar tecnologia moderna
para prolongar a vida ou deveria deixar jovens pacientes com
insuficiência cardíaca morrerem miseravelmente?
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